HÁ POESIA NA ESQUINA VIRTUAL

 HÁ POESIA NA ESQUINA VIRTUAL 

 
Demorei a entender que a poesia tem um espaço social garantido. Um dos motivos que a fazem merecer tal tratamento é a insuficiência do discurso lógico. É engraçado observar que no século passado, enquanto a ciência ia se afirmando como discurso oficial, a poesia permaneceu cumprindo seu papel, mesmo que inocentemente delegado aos “loucos”. 
Discurso da loucura, talvez. A loucura que salvou a palavra do discurso asséptico da ciência. A loucura que aproximou a poesia da psicanálise, no mesmo século, seja pela fixação na palavra, seja por reconhecer suas limitações.
Se comunicar é nossa frustração garantida, a poesia é a brincadeira que faz o ato impossível da comunicação parecer realidade. De fato, a realidade poética é outra.
Com os meios de comunicação de massa, vimos nascer ainda uma poesia de entretenimento, de consumo. Nada contra as poesias do cotidiano, mas não é esse o caso. Com o cinema comercial e com a publicidade, por exemplo, a poesia passou a ser ilustração de outras intenções.  
Para se ter poesia, é preciso ter frestas. Não é o que acontece com os meios de comunicação de massa, que escancaram, e por isso mesmo limitam, todas as supostas possibilidades. Nem com a ciência, que resolve o sentido antes mesmo de termos a informação. É essa uma das razões que fizeram a poesia sempre conviver tão bem com o underground, ambiente de tantas festas.  
Quando conhecemos uma cidade, os espaços mais poéticos são os localizados justamente nas frestas, fora do mapa turístico, espaços que exigem interação tanto para serem descobertos quanto para se desfrutar da poesia que concentram
No Ciberespaço, a essência da manifestação da poesia não é muito diferente do que no espaço físico. A forma com que ela se manifesta, sim, é distinta. Mas isso é outro assunto.
Certamente, a mais saborosa poesia virtual não estará nos grandes portais, até porque eles imitam, no Ciberespaço, a estrutura da comunicação de massa. Nem será descoberta por quem tem com o espaço virtual uma relação também ilustrativa, distante, quase como se fosse um mal necessário. Ler poesia exige atitude. E esta tem sua própria maneira de se mostrar no virtual:
A INTERNET NÃO É ILUSTRAÇÃO DA VIDA – Sites de relacionamento, caixas de mensagens, não são uma extensão da vida. São a própria vida acontecendo ali, on-line. Enquanto o internauta não se apropria do espaço próprio que a Internet é, ela continua apenas ilustrando seu cotidiano e não fazendo parte dele, apesar de todas as possibilidades e informações continuarem à disposição ali, naquele computador conectado. 
A WEB NÃO É UM JORNAL ELETRÔNICO – Muito além da informação, há na Web a interação. A primeira encerra em si, com algum consumidor de informação. A segunda gera informações, provoca questionamentos, revela pessoas, constrói conhecimentos e posicionamentos. 
O VIRTUAL É UM ESPAÇO PRÓPRIO – A navegação na Web, que faz a virtualidade do Ciberespaço se atualizar em cada endereço acessado, inaugura uma nova maneira de conviver com a palavra, com o texto: cada vez mais, a palavra remete menos a texto e mais a hipermídia; cada vez mais, o texto passa a ser hipertexto, com todas as possibilidades existentes nos hiperlinks, a sinalização de trânsito da Web.  
Encontrar uma poesia própria da Cibercultura, uma língua mais genuína do Ciberepaço, exige ao menos essas atitudes. Há uma esquina virtual. Só consegue chegar até lá aqueles que sabem que “download” não é o dragão do castelo; que “Youtube” não é a nova televisão; que a Internet não é um local de divulgação, mas de construção; e que Web 2 não é uma nova Internet, mas uma atitude.

Eros Trovador
Abril de 2009